A decisão proferida pela 11ª Vara do Trabalho da Zona Sul de São Paulo, condenando uma empresa a pagar indenização por danos morais a um homem trans, traz à tona a importância de se proporcionar um ambiente de trabalho adequado e seguro, que respeite as particularidades de cada funcionário. Essa sentença demonstra um avanço no reconhecimento dos direitos das pessoas trans e reforça a necessidade de cumprir com os princípios estabelecidos na Constituição Federal e na LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados).
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) estabelece diversos princípios fundamentais para a proteção dos dados pessoais, entre eles o princípio da não discriminação. Esse princípio visa garantir que o tratamento de dados pessoais não seja realizado de forma discriminatória, seja em razão de características pessoais, como gênero, orientação sexual, raça, etnia, religião, entre outros.
A Carta dos Direitos Humanos, também conhecida como Declaração Universal dos Direitos Humanos, é um documento internacional que estabelece os direitos fundamentais de todas as pessoas, independentemente de sua raça, cor, gênero, orientação sexual, religião, nacionalidade, origem étnica, entre outras características. Um dos princípios essenciais dessa carta é a vedação à discriminação.
A vedação à discriminação presente na Carta dos Direitos Humanos reforça a importância de tratar todas as pessoas de forma igualitária e sem qualquer forma de discriminação. Isso significa que todas as pessoas têm o direito de serem tratadas com dignidade, respeito e justiça, sem serem alvo de discriminação ou preconceito.
No caso em questão, a discriminação em relação à identidade de gênero do funcionário trans é claramente contrária aos princípios da Carta dos Direitos Humanos. A carta estabelece que todas as pessoas têm o direito de serem reconhecidas e tratadas em igualdade de condições, sem sofrer discriminação com base em sua identidade de gênero ou qualquer outra característica protegida.
Como prevê seu artigo 7º “Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação”.
O trabalhador em questão relata que, durante seus contratos com a empresa, enfrentou a recusa em ser tratado de acordo com seu gênero masculino, sendo obrigado a se apresentar como mulher aos clientes, mesmo tendo realizado a alteração de nome em sua identidade. A empresa, por sua vez, justificou sua posição alegando restrições técnicas no sistema de gestão de pessoal, que estava vinculado ao registro de CPF/PIS do funcionário, onde constava o gênero feminino.
Ao analisar o caso, o juiz destaca que o processo de transição de gênero de uma pessoa trans é cercado de burocracias e dificuldades, como a falta de apoio jurídico, financeiro e social. Nesse sentido, é considerado irrazoável e incompatível com os princípios constitucionais exigir que o indivíduo realize alterações em diversos cadastros governamentais antes de poder adotar sua identidade de gênero no ambiente de trabalho.
Além disso, o magistrado observa que, mesmo ao encerrar o contrato de trabalho, a empresa em questão manteve o nome civil do funcionário em uma carta de recomendação, evidenciando que a postura discriminatória e transfóbica não se restringia apenas ao sistema utilizado. Para o juiz, o programa de diversidade e inclusão mantido pela empresa não alcançará seu objetivo enquanto “obstáculos técnicos” forem utilizados como desculpa para desrespeitar um aspecto tão fundamental para a pessoa, como o seu nome.
Essa decisão judicial ressalta a importância de se promover um ambiente de trabalho inclusivo, que respeite as identidades de gênero, em conformidade com os princípios estabelecidos na Constituição Federal, bem como as diretrizes da LGPD. A Constituição assegura a igualdade de todos perante a lei, sem qualquer forma de discriminação, inclusive de gênero. Além disso, ela protege a dignidade da pessoa humana e estabelece os fundamentos para uma sociedade justa e solidária. É fundamental que as empresas se adequem às demandas da diversidade, superando os desafios técnicos e burocráticos, e se comprometam com o respeito à dignidade e aos direitos de todos os seus colaboradores.