A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) emitiu uma decisão de grande impacto no âmbito da fraude em execução fiscal, gerando implicações relevantes para a aplicação da legislação. No desenrolar de um processo emblemático, identificado como um caso representativo de controvérsia, a interpretação fornecida pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) estabeleceu uma diretriz essencial: a transferência de ativos pertencentes ao devedor, ocorrida após a inscrição do débito tributário em dívida ativa, caracteriza fraude contra a execução fiscal. Um aspecto notável é que a prova de má-fé por parte do adquirente ou o registro de penhora não são requisitos necessários para tal caracterização.
Este posicionamento realça a distinção crucial existente entre dívidas tributárias e não tributárias. O Código de Processo Civil estipula condições específicas para a ocorrência de fraude à execução em casos não tributários, como a exigência do registro de penhora ou da prova da má-fé do terceiro adquirente. Contudo, a análise efetuada pelo STJ reforça que tais requisitos não se aplicam no contexto das execuções fiscais.
O ministro Luiz Fux, responsável pela relatoria do caso, afirmou de maneira enfática que “a lei especial prevalece sobre a lei geral”, destacando que a Súmula 375 do STJ, que aborda a fraude à execução, não é pertinente às execuções fiscais. Essa súmula dispõe que “o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.
Este entendimento é válido para situações cíveis, que são reguladas pelo Código Civil e pelo Código de Processo Civil. A fraude em execução fiscal, por sua vez, é regida pelo artigo 185 do Código Tributário Nacional (CTN). O ministro salientou que os precedentes que levaram à formulação da Súmula 375 não foram originados em processos tributários.
No cerne do caso em análise, a Fazenda Nacional ingressou com uma ação visando executar a dívida de um contribuinte do Paraná. Três dias após receber a citação, em outubro de 2005, o devedor efetuou a venda de uma motocicleta importada da marca Yamaha, ano 2000. Posteriormente, em 2007, a Justiça deferiu a penhora do veículo. O comprador, então, interpôs embargos de terceiro, que foram julgados procedentes em primeira instância.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) manteve a decisão proferida pelo juiz. O TRF4 sustentou que “não se configura fraude à execução se, à época da compra e venda, inexistia restrição judicial sobre o veículo alienado. Mesmo com a citação do devedor, prévia à alienação do bem, seria necessário que o credor provasse a ciência do adquirente acerca da execução fiscal contra o alienante, para que se configurasse a fraude”.
Nesse contexto, o ministro Luiz Fux enfatizou que o artigo 185 do CTN estabelece de forma clara que “consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa”. Antes de junho de 2005, quando houve a modificação deste artigo, a venda deveria ocorrer após a citação do devedor.
O relator ressaltou que a fraude de execução, em contraposição à fraude contra credores, possui um caráter absoluto. Nesse contexto, não é necessário comprovar a conivência entre o vendedor e o comprador. A constatação da fraude é objetiva, não dependendo das intenções dos participantes do negócio. Ele ressaltou que é suficiente que a alienação tenha levado à frustração da execução em decorrência da alienação.
O ministro destacou ainda a diferença na abordagem entre a fraude civil e a fraude fiscal, justificando que a primeira lida com interesses privados, enquanto a segunda aborda o interesse público. Ele salientou que o recolhimento de tributos tem o propósito de atender às necessidades coletivas.
Em relação ao registro da penhora, o ministro argumentou que tal requisito não pode ser uma exigência para a caracterização da fraude no âmbito dos créditos tributários. Ele explicou que o artigo 185 do CTN, que estipula a configuração da fraude, estabelece como únicos requisitos a inscrição da dívida anteriormente à alienação e a ausência de outros bens que possam satisfazer o credor.
Com esse entendimento firmado de maneira unânime, a Primeira Seção proferiu uma decisão favorável à Fazenda Nacional.