A Lei Anticorrupção do Brasil, sancionada em 2013, marcou um ponto de inflexão significativo na forma como as empresas lidam com denúncias internas. Originalmente, essa legislação foi promulgada para encorajar práticas de compliance e mitigar sanções administrativas por corrupção, incentivando a criação de canais internos de denúncias, como hotlines. No entanto, uma década após sua implementação, esses canais evoluíram, refletindo uma mudança significativa nos tipos de denúncias recebidas.
No início, esses canais focavam principalmente em questões de corrupção, mas, com o passar dos anos, houve um deslocamento notável para questões comportamentais, como assédio moral, sexual e discriminação. Este fenômeno não é exclusivo de uma empresa, mas sim um reflexo das mudanças nas preocupações sociais e nos valores organizacionais. Em várias grandes corporações, as denúncias relacionadas a conflitos interpessoais e violência no trabalho começaram a superar aquelas relacionadas a atos de corrupção.
Este deslocamento pode ser atribuído a diversos fatores. Primeiramente, houve uma evolução nos valores da sociedade em relação à ética, integridade e respeito no ambiente de trabalho. Práticas anteriormente toleradas hoje não são mais aceitáveis. As empresas que falham em atender a essas novas expectativas correm o risco de serem marginalizadas no mercado.
Outro aspecto importante é o amadurecimento das próprias plataformas de denúncia. Com o avanço tecnológico, esses canais tornaram-se mais seguros e anônimos, aumentando a confiança dos colaboradores em utilizá-los. Isso é complementado pela gestão de terceiros independentes, que ajudam a garantir a imparcialidade no tratamento das denúncias.
Adicionalmente, a legislação recente também desempenhou um papel significativo. A Lei Emprega + Mulheres, por exemplo, exige que as empresas implementem procedimentos para o recebimento e acompanhamento de denúncias de forma anônima, focando principalmente no combate ao assédio sexual no trabalho. Esta lei, junto com outras iniciativas legais, tem contribuído para a implementação e o fortalecimento dos canais de denúncias nas empresas.
Além disso, os treinamentos anuais sobre violência e assédio, exigidos pela legislação, ajudam a elevar a conscientização sobre esses temas, levando a um aumento nas denúncias relacionadas. Este movimento é reforçado pela mudança na cultura corporativa, onde as empresas começam a reconhecer que as ferramentas de integridade não são apenas para detecção e prevenção de corrupção, mas também para o controle de riscos comportamentais.
Por fim, a influência de empresas estrangeiras, que seguem normas internacionais de compliance, tem sido um fator crucial para fomentar essa cultura nas empresas locais. O que começou como um esforço para combater a corrupção agora se transformou em uma ferramenta abrangente para abordar uma variedade de questões éticas e comportamentais no ambiente de trabalho.
