RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS: MUDANÇAS LEGISLATIVAS E JURISPRUDENCIAIS

19 de fevereiro de 2024

A Lei 11.101/2005, conhecida como Lei de Recuperação Judicial e Falências, estabelece que todos os créditos existentes até a data do pedido de recuperação judicial estão sujeitos a ela, independentemente de já terem vencido. No entanto, créditos tributários são excluídos dessa regra, baseando-se no princípio de que tributos só existem por força de lei específica, e, por conseguinte, sua exclusão também deve seguir o mesmo princípio legal.

De acordo com o Código Tributário Nacional (CTN) e legislações complementares, especificamente nos artigos 187 do CTN e 29 da Lei nº 6.830/1980, a cobrança judicial de créditos tributários não se submete a processos de recuperação judicial ou falência. Isso significa que, em casos de recuperação judicial, a empresa devedora não pode incluir suas dívidas tributárias na renegociação com credores. Além disso, a concessão da recuperação judicial depende da apresentação de certidões que comprovem a regularidade fiscal da empresa, reforçando a autonomia dos créditos tributários frente aos demais tipos de créditos.

O Superior Tribunal de Justiça suspendeu a prática de atos constritivos, como penhoras, em execuções fiscais contra empresas em recuperação judicial. Essa suspensão foi implementada através do Tema Repetitivo 987, que vigorou até a sua revogação em 2021, restabelecendo a possibilidade de atos constritivos em execuções fiscais contra empresas em recuperação judicial. Essa mudança jurisprudencial ressalta a importância da cooperação jurisdicional, conforme o Código de Processo Civil de 2015, permitindo ao juízo da recuperação judicial avaliar a viabilidade das constrições realizadas em execução fiscal.

A Fazenda Nacional argumentou que a suspensão dos atos constritivos em razão do Tema Repetitivo 987 levou a uma paralisação significativa nos processos, com um volume considerável de dívidas tributárias de empresas em recuperação judicial permanecendo em aberto. A Lei 14.112/2020, que revogou e modificou partes relevantes da Lei 11.101/2005, introduziu a possibilidade de substituição dos atos de constrição sobre bens essenciais à atividade empresarial, promovendo a cooperação jurisdicional.

A jurisprudência recente e as mudanças legislativas destacam a busca por um equilíbrio entre a efetivação da cobrança de créditos tributários e a preservação da função social e da continuidade das atividades das empresas em recuperação judicial. Isso implica a possibilidade de utilizar mecanismos como a reserva de crédito para garantir a execução fiscal sem comprometer o plano de recuperação da empresa. Esse enfoque cooperativo e adaptativo do processo civil moderno visa promover os direitos fundamentais das partes envolvidas, permitindo a adaptação dos procedimentos processuais para atender às peculiaridades de cada caso, especialmente no que tange à recuperação de empresas.

Portanto, a legislação brasileira, através de uma interpretação sistemática da Lei de Recuperação Judicial, do Código de Processo Civil, e da Constituição, contempla não apenas a cobrança de créditos tributários mas também a preservação da função social das empresas. Isso evidencia uma evolução na forma como o direito trata a recuperação judicial, buscando não apenas a satisfação dos créditos, mas também a sustentabilidade das atividades empresariais no longo prazo.