A decisão governamental de revogar o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) através da Medida Provisória nº 1202/23 tem suscitado controvérsias significativas no âmbito jurídico e econômico, especialmente em relação aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima. Instituído pela Lei nº 14.148/21, o Perse surgiu como um mecanismo de socorro ao setor de eventos, um dos mais afetados pela pandemia de Covid-19, concedendo, entre outras coisas, isenção fiscal por um período de 60 meses.
A Lei nº 14.148/21, em seu artigo 4º, estabelece claramente a redução a zero das alíquotas de determinados tributos para as empresas do setor de eventos, com o objetivo de oferecer um alívio financeiro que permitisse a sobrevivência e a recuperação dessas empresas. A tentativa de anulação desses benefícios por meio de uma medida provisória não só contraria o texto expresso da lei, mas também desconsidera os princípios básicos que regem o direito tributário e a própria confiança que o setor depositou no marco legal estabelecido.
O argumento do governo de combater fraudes cometidas por entidades que, de forma indevida, se beneficiaram do programa, embora relevante, não se sustenta como justificativa para a revogação generalizada das medidas de suporte. Ao invés disso, caberia à administração tributária a responsabilidade de identificar e sancionar os infratores específicos, preservando a integridade do programa para aqueles que legítimamente se enquadram em seus critérios.
A revogação do Perse, nesse contexto, representa uma ameaça não apenas à sobrevivência de um setor vital para a economia, mas também ao princípio de segurança jurídica, essencial para a estabilidade e previsibilidade necessárias ao investimento e ao desenvolvimento econômico. O setor de eventos, importante para a geração de empregos e para o impulso de segmentos econômicos como o turismo, hospitalidade, serviços e comércio, merece uma consideração cuidadosa e proporcional, que reconheça sua importância e contribuição para a economia nacional e internacional.
Como destacou René Descartes, o bom senso é uma das qualidades mais bem distribuídas, sugerindo que a aplicação equitativa e sensata da lei é fundamental. Diante disso, é imperativo que o governo reavalie sua abordagem, buscando soluções que harmonizem a necessidade de fiscalização e justiça fiscal com o imperativo de apoiar e fomentar a recuperação de um setor essencial para a economia e a cultura.