Em um cenário jurídico complexo e em constante evolução, a gestão dos créditos de ICMS, especialmente em operações de transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, se apresenta como um dos temas mais desafiadores para as empresas brasileiras. Este assunto ganhou ainda mais relevância após a publicação de novas normas federais e estaduais em 2023, destinadas a regulamentar essas transferências, uma medida que veio na esteira da decisão histórica do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2021, que invalidou a cobrança de ICMS nessas operações, sem, no entanto, esclarecer completamente o tratamento dos créditos acumulados de ICMS.
A recente decisão da 13ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) representa um marco nesse debate, ao conceder uma liminar que permite a uma empresa do setor de fios e cabos elétricos a opção de se apropriar dos créditos de ICMS nas operações de transferência entre suas unidades. Esse posicionamento judicial destaca-se por desconsiderar as restrições impostas pelo Convênio 178 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), pela Lei Complementar nº 204/2023, e pelo Decreto estadual nº 68.243/2023, demonstrando uma flexibilidade importante para as estratégias fiscais das empresas.
Ao analisar as bases desse julgamento, é essencial reconhecer a importância dos princípios de isonomia tributária, livre iniciativa, segurança jurídica, e da natureza não cumulativa do ICMS. A decisão reflete um entendimento de que as empresas devem ter a liberdade de gerir seus créditos de ICMS de maneira que melhor atenda às suas necessidades operacionais e estratégicas, sem imposições que possam comprometer a eficiência e a equidade do sistema tributário.
No entanto, é fundamental observar que existem diferentes interpretações sobre a extensão e as implicações da decisão do STF, principalmente no que tange à regulamentação estadual dos créditos de ICMS. Alguns estados têm buscado impor limitações à transferência desses créditos, o que gerou uma série de contestações judiciais, refletindo a complexidade e a incerteza que ainda cercam essa questão.
As empresas, por sua vez, enfrentam um dilema: seguir as regulamentações estaduais, que podem ser mais restritivas do que o entendimento adotado pelo STF, ou buscar na Justiça o direito de gerenciar seus créditos de ICMS com maior flexibilidade. Esta situação se torna ainda mais crítica com a aprovação da reforma tributária, que promete alterar profundamente o sistema de tributos no Brasil, incluindo o ICMS, e estabelece um período de transição que exige uma gestão ainda mais cuidadosa dos créditos acumulados.
A decisão do TJSP, portanto, não apenas favorece a empresa em questão, mas também sinaliza para um entendimento jurídico que pode beneficiar uma ampla gama de contribuintes, especialmente em um momento de transformações significativas no cenário tributário brasileiro. À medida que o debate sobre a gestão dos créditos de ICMS evolui, é importante que as empresas se mantenham atentas às decisões judiciais e às mudanças legislativas, buscando estratégias que assegurem a máxima eficiência fiscal e a conformidade com a legislação.