O processo de desjudicialização no Brasil vem ganhando força como uma resposta à crescente demanda por celeridade e eficiência na resolução de conflitos. Essa transformação busca transferir para esferas administrativas questões que anteriormente eram de competência exclusiva do Judiciário, reservando a este último a análise de litígios mais complexos. Um exemplo significativo dessa tendência está no Direito Notarial e Registral, especialmente com a possibilidade de realizar inventários extrajudiciais. Essa alternativa foi introduzida pela Lei 11.441/2007 e consolidada no Código de Processo Civil de 2015.
Recentemente, o cenário foi ainda mais ampliado com uma importante inovação normativa que permite a inclusão de menores e incapazes no inventário extrajudicial. Essa mudança foi instituída pela Resolução 571/24 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), representando um marco na evolução desse procedimento. No entanto, sua implementação também traz desafios, como a uniformização das práticas e a proteção efetiva dos direitos dos indivíduos vulneráveis.
O Papel do Inventário Extrajudicial no Ordenamento Jurídico
O inventário extrajudicial consiste em um procedimento administrativo realizado em cartório, destinado à partilha de bens deixados por uma pessoa falecida. Foi concebido como uma alternativa ao processo judicial, oferecendo maior agilidade, redução de custos e simplicidade aos herdeiros, desde que preenchidos os requisitos legais. Entre eles, destaca-se a necessidade de consenso entre os herdeiros e a assistência de um advogado ou defensor público para garantir a validade do ato.
A regulamentação desse modelo foi aprimorada por normativas do CNJ e de Tribunais estaduais, padronizando os procedimentos e documentos necessários. Assim, o inventário extrajudicial se consolidou como uma ferramenta de acesso à justiça e solução eficiente para questões patrimoniais.
Inclusão de Menores e Incapazes: Uma Nova Perspectiva
A Resolução CNJ 571/24 introduziu mudanças significativas, permitindo a realização de inventários extrajudiciais mesmo em casos que envolvam herdeiros menores ou incapazes. Essa ampliação, que rompe com a tradicional restrição desses casos ao âmbito judicial, foi acompanhada de salvaguardas para proteger os direitos dos vulneráveis. A atuação do Ministério Público como fiscal da lei tornou-se indispensável, garantindo que o patrimônio seja gerido e partilhado com segurança.
Além de priorizar a celeridade, a nova normativa reforça o princípio da proteção integral, assegurando que as necessidades dos menores e incapazes sejam respeitadas. Contudo, em situações de controvérsia ou dúvida sobre a partilha, o procedimento é remetido ao Judiciário, preservando a possibilidade de uma análise mais aprofundada.
Entraves Práticos e Propostas de Solução
Apesar dos avanços, desafios práticos permanecem, especialmente em relação à resistência de algumas instituições financeiras. Essas entidades frequentemente impõem exigências burocráticas e demandam documentos não previstos em lei, retardando o processo e gerando custos adicionais aos herdeiros. Essa postura, além de desvirtuar a essência do inventário extrajudicial, expõe os interessados a prejuízos patrimoniais e emocionais, principalmente em casos que envolvem menores.
Outro ponto crítico é a demora na liberação de informações bancárias e recursos para pagamento de tributos. Essa morosidade, frequentemente justificada como etapa interna necessária, contraria a legislação e compromete o objetivo de eficiência do procedimento.
Para enfrentar esses desafios, é essencial a atuação integrada entre o CNJ, o sistema financeiro e os órgãos de classe. Normativas mais detalhadas e fiscalização rigorosa podem inibir práticas abusivas, enquanto a capacitação dos profissionais envolvidos contribui para uniformizar os procedimentos e reduzir conflitos.
A ampliação do inventário extrajudicial para casos envolvendo menores e incapazes é um passo significativo na modernização do sistema jurídico brasileiro. Esse modelo, além de promover maior agilidade, demonstra um compromisso com a inclusão e a proteção dos vulneráveis. Contudo, a superação dos desafios práticos exige um esforço coordenado de todos os agentes envolvidos, incluindo tabeliães, advogados, Ministério Público e instituições financeiras.
Com regulamentação adequada, fiscalização eficaz e capacitação contínua, o inventário extrajudicial pode consolidar-se como uma ferramenta indispensável para garantir acesso à justiça, eficiência e segurança jurídica, beneficiando todas as partes interessadas.